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sábado, 22 de março de 2025

Se um dia eu me for... (Desabafo)

Eu sei que vocês olham pra mim e sentem decepção. Na verdade, eu sempre senti esse peso em cima de mim desde muito pequena, sem entender muito o porquê: talvez por estar sempre sendo silenciada, por sempre ter me sentido excluída em qualquer expressão de afeto, por ter vivido pulando de casa em casa de parentes, por volta e meia ter sido esquecida na escola... Ou talvez simplesmente por ter passado a vida fazendo das tripas coração pra tentar agradar de alguma forma, sendo uma excelente aluna, amada pelos professores, conquistando as melhores notas e buscando a perfeição em tudo que me propus a fazer - mas parece que nunca foi suficiente, né? E continua não sendo até hoje, não importa o que eu faça.


Vcs lembram que eu dizia na adolescência que assim que eu fizesse 18 anos, ia dar um jeito de sair de casa e me livrar desse ambiente tóxico daqui? De um lado, violência verbal e física, além de invasão de privacidade. Do outro, total indiferença. Pois é: eu não saí de casa pra "formar família" não, eu quis FUGIR. E no desespero de sair de um buraco, não pude enxergar que eu caía em outro - mas quando finalmente enxerguei, era tarde demais e meu primeiro filho já estava a caminho.

Vocês podem achar que isso é tudo bobagem, mas por essas e outras, vivi em depressão por cerca de 30 anos. E eu pedi socorro quando eu tinha 15 anos. Pedi pra me levarem no médico porque eu sabia que eu era diferente dos amigos da minha idade, e pq eu não aguentava mais pensar em morrer TODO SANTO DIA desde os 12 anos, quando por muito pouco, quase tentei contra minha própria vida - vocês nunca souberam pq não estavam em casa e eu aproveitei pra tentar alcançar a embalagem de veneno de rato no alto do armário do banheiro. Eu já estava me esticando trepada em cima do vaso quando o telefone tocou. Era minha saudosa tia-avó com uma conversa totalmente non-sense. Ainda atordoada, eu tentava entender porque ela tinha ligado perguntando por vocês se vocês tinham saído dizendo que iam vê-la. Então ela me distraiu até vocês chegarem e desligou. Até hoje nada me tira da cabeça que foi coisa do meu Anjo da Guarda... Mesmo assim, eu não conseguia tirar da cabeça a ideia quase obsessiva de não viver mais - mas aí eu lembrava desse dia e isso me segurava por mais um dia.

E eu sobrevivi a tiro, a uma relação abusiva, uma separação difícil, um boa-noite-cinderela no dia do meu aniversário de 30 anos em que me foram introduzidos objetos que até hoje não sei bem quais foram; vi os filhos pelos quais dei minha vida indo embora, passei fome... E eu me perguntando pq eu ainda resistia. Até que entrei na faculdade e as coisas começaram a mudar. E aos poucos a depressão me abandonou e eu achei que já podia me livrar dos 19 comprimidos diários que eu tomava já que, segundo vcs mesmos, "é tudo bobagem, tá tomando remédio à toa!". Não demorou pro auge das desgraças da minha vida estourar: um surto psicótico que os obrigou a me internar. Não tenho trauma nenhum da internação apesar de não ter sido fácil, mas guardo um trauma muito grande do período de readaptação. Fiquei extremamente sensível a qualquer tipo de estresse. Tenho medo de ter uma nova crise, porque é horrível se sentir incompreendida. Por isso tento fazer tudo certo - o que não me impede de me sentir incompreendida da mesma forma.

Eu nunca fui uma pessoa de grandes luxos. Todos os dias agradeço pelo teto e por cada refeição - pq só quem já não teve o que comer de verdade, sabe o valor que qualquer grão de feijão ou arroz tem. Mas vocês já pararam pra se colocar no meu lugar??? Uma mulher da minha idade, com as minhas condições físicas e mentais, que perdeu tudo, hoje dorme na varanda da casa dos pais sob uma cabana improvisada pra aliviar um pouco a intensidade de sons e luzes; que sempre tá disponível pra cozinhar algo gostoso pra todos por prazer (inclusive a quem nem me dirige a palavra ou se lembra do meu aniversário), que está sempre à disposição pra ajudar no peso das compras, ou mesmo em ajudar em outras tarefas da casa (inclusive na limpeza, quando consigo), ao mesmo tempo em que sou solenemente silenciada, ignorada, diminuída, ainda que eu esteja falando de um assunto sobre o qual tenho respaldo porque - vejam só! - eu ESTUDEI.
Vocês devem pensar "do que adianta estudar tanto se não está trabalhando?". Deixa eu responder: no princípio porque EU ERA TROUXA; porque eu ficava preocupada de deixar VOCÊS sem meu suporte ao longo da semana. Depois parei pra pensar e vi que, pelo desrespeito que vocês têm por mim, eu certamente não sou tão necessária assim. Mas pesquisando o mercado de trabalho, as poucas chances que há pra mim na minha idade prejudicam minha saúde mental e podem me levar à uma nova crise - a não ser que eu estude mais, gostem vocês ou não. E também penso em ter um negócio próprio: já pensei em mil coisas que eu simplesmente não consigo concretizar. E sabem por quê? Por que essa armadura aqui de "mulher foda pacaralho", de "liderança nata" é apenas instrumento de sobrevivência: por dentro ainda me sinto aquela criança insegura que vai dar seu máximo, mas nunca será o suficiente pra nada nem ninguém (e que se surpreende muito - e nem sempre acredita - quando recebe elogios e declarações de admiração e afeto de outras pessoas).

E onde quero chegar com isso? Bem, não sei se vocês sabem ou entendem mas estou pra fazer uma colposcopia com biópsia, que aliás estou esperando há muito tempo pro SUS me liberar, desde o ano passado, quando meu preventivo detectou lesões nível 2 e 3 no meu colo do útero (o nível 3 é o último estágio pra se tornar um câncer). Não estou de fato preocupada, mas quero logo fazer esse exame pra saber se o câncer já me alcançou de fato - pode ser que sim e pode ser que não, mas sinceramente, às vezes torço pra que seja sim: minha vida está perdendo cada vez mais o sentido, me sinto mais mal tratada que os cães dessa casa; a única coisa que me prende ainda nesse mundo são meus filhos, mas eles já estão adultos e não precisam mais de mim - e se precisarem, eu sempre estarei a postos "do lado de lá". Também não quero mais ser um elefante branco no meio da sala de vocês. E eu acho que já deu. Não parece não, mas minha alma está cansada. É um cansaço que fica aqui dentro, roendo um buraco no peito, deixando só um rastro de vazio. Se eu me for, eu vou tranquila: fiz o que quis, da melhor forma que pude. Nunca fui perfeita, mas a Vida me ensinou que querer a perfeição é disputar ego com Deus - e quem sou eu na fila do pão, não é mesmo? Sei que serei bem recebida do outro lado - a família espiritual (ao menos ela!) nunca me abandonou e sempre segurou minhas pontas.

Então, é isso. Eu só queria que vocês soubessem mesmo - e com certeza, eu nunca conseguiria me fazer expressar porque meu pai ou falaria por cima e me interromperia, ou me ignoraria ao dar mais atenção aos vídeos do celular. Ou ainda minha genitora tentaria justificar dizendo que "não se lembra", que é tudo coisa da minha cabeça ou mesmo culpa minha. E eu não quero mais disputar nada não, sabe?... 
Nem mesmo atenção ou razão.

Tô cansada, muito cansada...


(11/fevereiro/2025)

quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

Apenas mais um conto de natal

Eu queria a casa um brinco, mas limpei conforme minha humanidade permitiu.


Eu queria oferecer o melhor banquete, mas tentei fazer o melhor improviso possível diante dos cortes que tivemos. 


E nada disso foi pra ter o "natal dos sonhos" - até porque deixei de ser cristã há anos. 


Eu também não tinha expectativas, pois hoje reconheço e aceito as disfuncionalidades da minha família: eu só queria receber bem meus filhos, como não recebia havia tempos.


E nem fizemos nada demais: bebemos, cantamos karaokê, rimos, enfim, matei a saudade.

(Ah, sim: e cantei performando "All I want for christmas is you" pra eles, porque sim. 🤭)


E quando já estávamos todos bêbados, bem alimentados, sonolentos e nos preparando pra dormir, a caçula abre a mochila e tira uma embalagem - nem prestei atenção porque eu não parava de falar (fico assim quando estou animada).

Meu filho mais velho teve que chamar-me a atenção: "ah, a gente já ia esquecer! O seu presente!".


ÃHN? PRESENTE?


Curiosa, abro o embrulho - "mas eu só queria PRESENÇA!", pensava eu. Era um hidratante de cheiro muito delicado, "capim limão e hortelã", dizia o rótulo. "É cheiro de vó", meu filho brincou, todos rimos. 


Eu já estava abrindo a embalagem pra experimentar o aroma e congelei. Lágrimas me vieram aos olhos. Tomei fôlego pra explicar, pois meus filhos nada entendiam:


- Na verdade... É exatamente o cheiro da MINHA AVÓ!


Esfreguei um pouco nas mãos pra ficar cheirando o perfume da avó que me criou e faleceu há quase 25 anos. Era como se ela tivesse dado um jeito de estar presente, depois da crise de choro que tive no meu aniversário 10 dias antes, me perguntando por onde ela andava pois fazia tempo que eu não a sentia mais por perto. E ela não poderia ter reaparecido de forma mais nobre: através das mãos dos meus filhos.


Muitas vezes sentimo-nos mergulhados em solidão por fechar os olhos da alma: quantas vezes alguém que amamos não está cuidando de nós, de alguma forma?


Feliz 2025!

Axé-Shalom.

terça-feira, 19 de novembro de 2024

Neredesin?

"Foi um vento que passou
Que te trouxe e te levou
Deixando no corpo, a marca do amor
Que ficou no ar, ilusão no ar

A chuva que esse vento traz
Faz com que me lembre mais
De todos os sonhos que a gente sonhou
Planejou demais, demais

Bem que eu podia tentar te encontrar
Mas o vento forte
Que me afastou, te levou
Te escondeu longe demais

A chuva que esse vento traz
Faz com que me lembre mais
De todos os sonhos que a gente sonhou
Planejou demais, demais

E cada vento que soprar
Pode te fazer voltar
Encher o vazio que ficou no ar
E marcou demais, me marcou demais
Me marcou demais..."


"Vamos, precisamos seguir" - ele tinha ido buscar mais informações sobre o que estava acontecendo e retornou com o tom grave de urgência na voz. Não explicou muito, mas nem precisava: eu já sabia o quanto era perigoso permanecer naquele país e o quanto era impossível voltar à nossa vidinha pacata no interior da Capadócia.


Ele então me ajudou a conduzir nossos 3 filhos pequenos e o pouco que pudemos carregar em direção à plataforma do Tünel de Istambul. Havia outros refugiados de todas as idades para todos os lados, alguns sentados pelo chão tentando se aquecer naquele inverno austero. A sensação de melancolia em deixar nossas coisas e nossa terra pra trás me inspirava a criar um poema dentro da cabeça; poema esse que eu ficava repetindo mentalmente pra não esquecer - "assim que chegarmos ao nosso destino, encontrarei um papel pra escrever...". Eu tinha necessidade de registrar, se pudesse ao mundo, a dor que todo aquele conflito estava causando não só a mim e minha família, mas a milhares de pessoas, mas não havia como.


A caminho da plataforma, eu conduzia as crianças maiores em silêncio, mantendo o olhar no chão. Eu ainda podia sentir a mão de meu marido e seu grande vulto pelas minhas costas, me conduzindo. Como eu o admirava: e talvez por isso eu não conseguia fitar seu rosto. Eu sabia que, em algum momento daquela balbúrdia, precisaríamos nos separar momentaneamente, depois de uma vida inteira juntos (visto que nos conhecíamos desde a infância).

E isso me fazia segurar o choro na garganta.


Acordei assustada, curiosa e com a música "Wish you were here" (Pink Floyd) grudada na cabeça. Lembrava das roupas pesadas de inverno, dos sentimentos vívidos de amor e de angústia, do clima de guerra no entorno. Foi aí que eu resolvi buscar alguns detalhes na internet unindo peças do quebra-cabeça com ajuda do Google e do ChatGPT: tudo se confirma que a cena se passou na Turquia, durante a sua Guerra de Independência, no início do século XX. E nem era a primeira vez que eu sonhava com esse país (do qual sempre conheci quase nada): 4 meses antes eu tinha sonhado com a "minha adolescência" na Capadócia, época em que "meu marido" e eu nos apaixonamos (e vivemos um amor proibido, aparentemente por diferenças religiosas - e pelo visto, vencemos as resistências). 


Desde que me conheço por gente, sempre senti uma profunda saudade de algo ou alguém que eu nunca soube muito bem sequer explicar. Me lembro de acordar chorando de madrugada entre 3 e 5 anos por sonhos que se repetiam e chorar pelo mesmo sentimento ao ouvir a música citada de Verônica Sabino ou o tema de Fievel (como se eu entendesse a letra) sentindo uma enorme angústia, um buraco no peito. Eu olhava pela janela à noite e pedia às estrelas que, por favor, me buscassem de volta - mas essa sensação foi sendo apagada conforme fui crescendo e tive que administrar outras questões da vida. Talvez minha psicóloga tivesse razão: tudo isso talvez fosse apenas sintoma de não conseguir me encaixar numa família disfuncional. Vida que segue, né?


E eu achava mesmo que já tinha superado essa sensação depois de anos de terapia e uma vida inteira de todo tipo de experiências (de vida, relacionamentos, espirituais, etc.), mas depois desse último sonho, não consigo mais fechar os olhos sem ver novamente o cenário no Tünel de Istambul, sem sentir a ausência do caloroso e enorme vulto daquele companheiro com o qual compartilhei aquele momento, sem me perguntar se conseguiremos nos encontrar novamente. E voltei a sentir esse buraco no meio do peito novamente, essa saudade doída que aquela pequena eu de 4 anos sentia que só tinha sido preenchida há alguns anos, quando finalmente encontrei meu "Abraço-Casa" - mas do qual a Vida me afastou, mais uma vez (provavelmente por revivermos mágoas de outras existências).


Não posso afirmar com certeza que se tratam da mesma pessoa nas 2 encarnações, mas tem coisas que acontecem que são fortes demais pra refutar...


Curioso: pareço estar fechando um ciclo de 40 anos, afinal, por que isso tudo está voltando agora, que fiz 44 anos?


Axé-Shalom-Görüşürüz!

quinta-feira, 1 de agosto de 2024

Só queria fazer poema

Hoje eu só queria fazer poema.

Olhar para o céu e nele encontrar as palavras certas,

Aquelas de preencher o coração de alguém.

Saber escrever, quem sabe, uma história de amor eletrônica,

De caracteres contados e emoções infindas.

Eu só queria escrever poema

E relê-lo tantas e tantas vezes até acreditá-lo vivo.

Talvez sobre mim. Talvez sobre você.

Eu só queria saber escrever emoções das quais ninguém ainda escreveu.

Mas quem sou eu nesse Universo 

Senão um mero sonho daquilo que escreverei?

(Dannie Machado.)

sexta-feira, 19 de julho de 2024

Escuro e Doce como o Céu

À meia-luz em seu apartamento, depois de um dia que parecia surreal demais, ele se debruça na janela como quem busca algo no céu.


Não demorou muito, o interfone tocou: era o porteiro informando a chegada de uma encomenda.


- Poxa, acabei de chegar em casa...

- Não se preocupe: eu posso receber pro senhor.


Logo o porteiro tocou sua campainha com um embrulho cuidadoso de papel pardo reforçado com barbante nas mãos. Agradeceu confuso, pois não havia encomendado nada - mas havia um pequeno envelope preso com durex.


Do embrulho vinha um aroma que ele bem conhecia. Memória olfativa.


Se apressou então a desenrolar o barbante e rasgou com pouco cuidado o embrulho apoiado na mesa: era a tão conhecida torta de chocolate que só uma pessoa sabia fazer. E era o que mais precisava naquele momento.


Cortou uma fatia da cremosa torta e sentou à mesa. Só enquanto degustava a primeira garfada, lembrou do envelope que deixara ali ao lado - meio arriscado comer algo assim de onde nem tem certeza de onde veio. 


Se apressou então em abrir o envelope que continha apenas um pequeno cartão com as seguintes palavras escritas à mão:


"Quando olhar para o céu e ele lhe parecer escuro demais, lembre que, assim como essa torta, ele também pode ser doce (até porque há alguém por lá que olha por você).

Se precisar de outra torta de chocolate, você sabe onde me achar."


A segunda garfada desceu mais difícil. Pegou o cartão, o prato de torta e voltou à janela, tornando a admirar o céu - nesse momento, uma estrela cadente atravessou o céu do bairro nobre e o sal de suas lágrimas se misturava ao açúcar do chocolate, criando um novo sabor em sua língua - o sabor de saber que nunca esteve nem nunca estará só.

___________________________


Do outro lado da cidade, depois de ter recebido a mensagem do entregador avisando da missão cumprida, ela resolveu descansar depois de limpar a cozinha, tomando um banho morno e iniciando seus rituais físicos e espirituais antes de se recolher pra dormir.


Já havia se embrulhado toda nas cobertas como num casulo - mania antiga que sempre retorna no inverno - plugado o celular no carregador e, justo no momento em que ia ativar o modo "não perturbe", uma mensagem chegou no celular.


Não havia palavras, eram só 4 emojis: o primeiro, um sorriso com uma lágrima, e os outros eram 3 emojis que só eles compartilhavam entre si, até porque a forma que eles se comunicavam nunca fez muito sentido pra mais ninguém.


Era o jeito dele agradecer, ela sabia. Esboçou um sorriso de lábios trêmulos e, com os olhos marejados, retribuiu os 3 emojis de sempre.


Ela quis ter feito mais, dito mais... Mas a essa altura da vida, ela já aprendeu que dar espaço já é fazer muito.


Ativou o "não perturbe" do celular e se enroscou em seu casulo novamente, olhando para o céu profundamente escuro naquela noite através da janela. Não buscava por nada: só queria desaguar uma tristeza que nem bem era sua.


Axé-Shalom.



quarta-feira, 17 de julho de 2024

A Sina dos 3 dias

A rua de feira vazia. A enorme livraria. Produtores de cinema.


Eu observava tudo de longe, de uma calçada, acompanhada de 2 amigos. Então ele me vê e, de longe mesmo, sorri terno, na minha direção.


O blazer preto. Ele olha em volta a se certificar que ninguém mais reparava. Enfim, abre o blazer na minha direção que revela uma camiseta branca com os dizeres: "Não se esqueça que eu posso estar longe, mas eu não te esqueci".


Daí quem passou a olhar em volta fui eu: "isso é mesmo prá mim???" - meus amigos mesmo insistiam: "claro que é, gata! Presta atenção!!". Então o encarei novamente e ele acenava com a cabeça reafirmando (provavelmente tendo constatado a minha confusão). E então foi interrompido pelo grupo com o qual ele conversava.


Mas o blazer ainda estava lá, aberto de lado, exibindo os dizeres que eu relia quase sem acreditar.


Acordei com um forte barulho vindo da sala, como se alguém tivesse "trombado" na mesa de jantar. Eu ainda tinha comigo a presença da ternura de seu olhar e, ignorando o estranho som da sala, enrolada nas cobertas naquela fria madrugada, passei algumas vezes aquela imagem sonhada pela mente, o que me aquecia o coração e me fazia querer voltar àquele cenário. Mas a bexiga reclamou e me obrigou a ir ao banheiro. Voltei pra cama checando os móveis: tudo no lugar - inclusive a mesa da sala - e todos ainda dormindo. Estranho pra muitos; pra mim uma madrugada comum. Voltei então pra cama já sem a esperança de retomar ao sonho anterior.


Mas ao adormecer, voltei ao mesmo cenário. E dessa vez, eu me atormentava com aquela situação e tinha uma espécie de crise de pânico:


- Vamos, eu preciso sair daqui... Sair AGORA!!


Meus 2 amigos me entenderam e acharam melhor entrarem comigo na enorme livraria na qual estava havendo um evento. Enquanto um desses amigos buscava água pra mim, o outro tentava me distrair, me levando a uma parte da livraria em que havia uma pequena exposição que tinha paredes e tecidos muito brancos e tema circense. Tentamos acompanhar o "tour" mas não sei o que perdemos - só lembro que a guia contava uma história que terminava com uma palhaça dentro de um caixão (e sim, havia a reprodução de um caixão com uma palhaça, de maquiagem e tudo, ali). Me lembro ainda de poucos elementos, como um berço e 2 anjos em cera pendurados no meio do espaço. Eu estava extremamente desconfortável e pedi a meu amigo pra sairmos dali também.


Então encontramos o segundo amigo, que indicou uma espécie de palestra que ia ocorrer ali, em outro espaço - não sem antes me mostrar o jornal que tinha encontrado: nele, a grande notícia era a de que aquela confusão na rua da feira era um teste para protagonista de um filme live action do Cebolinha (sim, o da Turma da Mônica), e ELE tinha conseguido o papel (já havia até fotos da caracterização).


Me sentindo então mais leve, finalmente me encaminhei à tal palestra (que parecia ter cunho religioso)... 


Dessa vez, acordei definitivamente. Eu ainda me sentia especial, talvez por efeito da primeira parte do sonho, mas a imagem dos objetos um tanto mórbidos da segunda parte me deixava também um pouco perturbada. 


O jeito foi seguir a vida como tinha que ser, mesmo sentindo a falta dele - de alguma forma, eu já sentia havia dias que algo estava acontecendo. Ele não some assim. (E eu já tinha sonhado antes que conversava com seu irmão e ele dizia pra eu não me preocupar...)


Pois bem, os dias passaram. 3 dias depois desse último sonho, pra ser mais exata (e que eu já tinha esquecido). Até que, pelo fim da tarde, ele dá notícias. E não são nada agradáveis. Se o meu próprio chão sumiu debaixo dos pés, imagino o dele! Eu quase podia sentir o rombo que ocupava o meio do seu peito. Ele transformou a dor em poesia (é uma das coisas que temos em comum). Mas eu SENTIA. O buraco, a desorientação, estavam lá.


"Eu preciso sair daqui... AGORA!!"


O que mais me dói é que não posso fazer nada por ele. Nem sequer dar um abraço. Mas o que me conforta é que abraços reconfortantes não faltarão.


POR QUE PREVEJO COISAS QUE NÃO POSSO EVITAR???...


Axé-Shalom.

quinta-feira, 25 de abril de 2024

Mas afinal: quem cuida de quem cuida?

A menina romântica que suspirava com belas palavras 

Hoje está mais concentrada na frieza exata dos números.


Ora, mas não são de números que são feitas as canções que têm emocionado sociedades ao longo da História?


Não sei, estou confusa. Entre legatos e staccatos, troco palavras, esqueço nomes... A única certeza é a de quem sou. E essa que sou hoje já não tem mais a paciência de outrora.


Uns dizem ser seletividade social. Outros dizem ser geracional. E eu, secretamente, desconfio se minha fisiologia não esteja também tentando me passar a perna.


Os fortes também cansam. Os felizes também choram. E os esperançosos às vezes também deixam de esperançar. E eu me encontro bem no olho de um furacão que me tem deixado tão tonta que, mesmo sem beber, a ressaca me derruba o dia inteiro.


Eu não sei nem por onde começar a puxar o fio da meada desta cama-de-gato que me suspende no ar e me imobiliza. Eu só consigo sentir o frio da Sombra se aproximando de mim... 

Seria o Fim? 

Não é o que me preocupa agora: eu só queria ter forças pra lutar pelas soluções que os Anjos da Calunga me sopram aos ouvidos - ou sentar num canto, talvez num ombro amigo, e chorar até não me sobrar nenhuma angústia no coração.


Não, não é depressão. Essa foi minha companheira por mais de 30 anos e eu a conheço bem. E nem é tristeza o que estou sentindo: é simplesmente como se minha cabeça roubasse toda a energia do resto do corpo. Não é crise, estou bem... Meu psiquiatra me viu essa semana... Meu pai também diz que estou melhor que muita gente. Aí é que tá: ele tira essa conclusão baseado nas responsabilidades que assumo diariamente - e talvez seja justo isso que esteja me adoentando. Talvez todos os exames alterados tenham essa razão de ser. Talvez guardar tudo isso só pra mim também esteja atraindo a Sombra ainda mais pra perto... Mas o mais estranho é que eu não tenho medo dela; temo mais por quem posso deixar pelo caminho...


Estranho: hoje me conheço muito melhor, mas "não reconheço mais meu coração, (...) não que ele se recusasse a bater".


Deixa: isso não é para fazer sentido mesmo.


Axé-Shalom-Amém!


(Música incidental: "Motor", de Maglore.)

domingo, 31 de março de 2024

"Palavra Acesa" - Quinteto Violado

"Se o que nos consome fosse apenas fome
Cantaria o pão
Como o que sugere a fome
Para quem come
Como o que sugere a fala
Para quem cala
Como que sugere a tinta
Para quem pinta
Como que sugere a cama
Para quem ama
Palavra quando acesa, não queima em vão
Deixa uma beleza posta em seu carvão
E se não lhe atinge como uma espada
Peço, não me condene, oh, minha amada
Pois as palavras foram pra ti, amada
Pra ti, amada
Oh, pra ti, amada
Palavra quando acesa, não queima em vão
Deixa uma beleza posta em seu carvão
E se não lhe atinge como uma espada
Peço não me condene, oh, minha amada
Pois as palavras foram pra ti, amada
Pra ti, amada
Oh, pra ti, amada
Pra ti, amada
Pra ti, amada
Oh, pra ti, amada..."

sábado, 24 de fevereiro de 2024

Para uma boa faxina, é preciso tirar tudo do lugar

Arrastar móveis, tirar poeira, separar coisas que não queremos mais, enfim... Mas antes é preciso reconhecer a bagunça que nossa vida está.


Dizem que quando Exu tá nos guardando algo muito bom, ele dá uma "bagunçada" na nossa vida antes - outras religiões chamam isso de provação. Não importa, o processo é o mesmo, porque a Espiritualidade sabiamente não dá nada sem a certeza de que saberemos aproveitar as oportunidades.


Eu já tive essa sensação na vida: da Vida virar de cabeça pra baixo e, de repente, tudo se transformar - mas acima de tudo, EU me sentir transformada de dentro pra fora.


Um desses grandes processos que me transformaram foi ter tido a força de pedir a separação. Fui humilhada, perseguida, perdi muita coisa que me era cara (inclusive a guarda dos meus filhos), fui acusada de coisas que nunca fiz. Mas NÃO VOLTEI ATRÁS. Foi 1 ano procurando emprego enquanto segurava a onda de um Transtorno Bipolar desregulado (mais pra depressão) e dando uma lida aqui e ali pra tentar o Enem (no qual me inscrevi com o apoio da minha ex-sogra mas eu nem tava preocupada em passar ou não). Não dá pra contar nos dedos as madrugadas em claro que passei - ora por fome, ora por preocupação - ajoelhada, chorando e orando pedindo a Deus por forças pra superar aquela fase. Foi nessa época em que fui me aprofundando na Kabbalah e aprendendo a respeitar e confiar nos processos. De fato, até o fim do ano eu não tinha conseguido emprego, mas consegui o inesperado: mesmo fora do colégio havia mais de 15 anos e sem estudar, consegui no Enem nota suficiente pra entrar pelo Sisu em 2 universidades federais e ainda consegui vaga pelo Prouni.


O duro foi escolher o curso, mas depois de feita a matrícula, me senti a mulher mais poderosa do mundo, afinal, sozinha eu tava conquistando um dos grandes sonhos da minha vida! E ali eu já senti uma leve transformação: conseguia diferenciar quem era eu antes e quem passei a ser depois de ter me separado.


E a gente vai ficando mais madura e acha que já está ficando "velha demais" pra viver outro acontecimento que nos transforme tão profundamente... Ledo engano.


Mal sabia eu que ia viver um processo tão intenso quanto sair da realidade por um surto psicótico, ter passado uma temporada num hospital psiquiátrico vivendo e sentindo de tudo, sair e no processo de "reorganização da mente" cair direto numa pandemia... Mais de 4 anos de sensação de não-pertencimento e desorientação. Mas retomei a minha fé: voltei a entrar em contato com meus guias; pedi, implorei colo e orientação, e o mundo parecia continuar desmoronando... Mas nada é no nosso tempo, né? E no tempo certo veio um sinal daqui, outro dali, pessoas entrando em minha vida como se tivessem a missão de "virar chavinhas" na minha mente... E parece que meu coração acordou! Sim, toda aquela paixão de viver, realizar e fazer acontecer retornaram ao meu peito e já nem consigo me conter! Eu já nem me reconheço mais: é como se a Dannie de antes fosse outra totalmente diferente da de agora! 


Em primeiro lugar, já não venho me sentindo refém do Transtorno Bipolar (nem da depressão) faz tempo: aquela sensação que eu tinha antes de não fazer ideia de como eu iria me sentir nos próximos 5 minutos se foi. Me sinto estável e feliz por isso (enquanto antes a estabilidade dava tédio). Tenho muito mais consciência de quem sou e do que quero. É claro que a mudança de psiquiatra e o período de terapia TCC me ajudaram muito também, mas não dá pra ignorar que a forte experiência que vivi me transformou. Observando outras pessoas, percebo que é comum que quem passou por experiências extremas acabam dando mais valor às pequenas coisas da vida e à própria vida em si (ao contrário de quem foi mais "protegido" das dificuldades, digamos assim). E isso só faz eu me orgulhar da mulher que sou e que tenho me tornado a cada dia.


É isso: meus desafios ainda não findaram, mas os estou vivendo com a fibra que sempre tive e achei ter perdido. Mas, pra além disso: com a alegria da minha criança interior que por anos teve que sufocar seu real propósito.


E isso não tem preço.


"I'll be raising from the ground like a Skyscraper..." (Demi Lovato).


Axé-Shalom-Amém!

quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

"Como se Duas Facas se Riscassem Procurando o Corte..."

Faz tempo que eu já não penso na gente, né... Eu sei, eu já tinha aceitado nosso destino, mas aquele sonho de setembro que veio do nada acendeu minha ansiedade. Ter sentido seu abraço, ouvido sua voz e ficar ali, assistindo você falar gesticulando do jeito que só você sabe mexeu tanto comigo que até demorei a acordar, sentindo sua presença tão forte me deixando aos poucos. 


E outros sonhos confusos eu tive, misturando mil paranoias. Perguntei então aos oráculos que já conheço, mas lê-los pra mim mesma já é complicado, ainda mais ansiosa. Então encontrei alguém que lesse pra mim - e as verdades que ouvi foram inacreditáveis: a pessoa refez todinha a nossa história na minha cabeça e eu entendi muita coisa. 


Então outros sonhos vieram pra acalmar ainda mais meu coração, como aquele sonho da Cartomante (em que eu embarcava numa viagem deixando o recado "ó, avisa a ele que não deu pra me despedir, mas assim que eu voltar, eu ligo") e um outro em que minha Cigana me avisou: "se acalma! Você não precisa fazer nada! Vocês têm dois processos a passar, e já passaram por um... Só falta o segundo..." (não entendi que "dois processos" são esses, mas eu sempre confio em meus guias).


Acho que, no fundo no fundo, pra começar, seria importante a gente um dia poder botar tudo em pratos limpos. Mas de forma madura: sem máscaras, sem mentiras, sem dramas. E pra ser bem sincera, apesar d'eu ainda saber que o amo muito, eu não faço ideia de qual seria minha reação se a Vida me colocasse de frente a você nesse momento. Porque são tantos sentimentos misturados... Tantas mágoas que calei na época, tantas perguntas, tantas fofocas que escutei, tantas incertezas... Sei que não sou santa e errei muito contigo, já inclusive busquei muitos meios de pedir perdão sem resposta, mas essas culpas hoje já não me pesam tanto nas costas. Talvez você esperasse de mim um ser perfeito demais pro que eu sou, talvez eu tenha atingido os seus pontos mais frágeis - mas, entenda: tudo que arde, cura. Ou você ainda não entendeu que eu não nasci pra ser seu estandarte, mas sim o mertiolate da sua vida e te questionar, enquanto a maioria sempre só soube te responder "eu concordo"?


Você também entrou na minha vida pra me ensinar muita coisa - inclusive que sou sim, capaz de ser amada, a acreditar mais em mim e na minha forma de amar, mesmo que pelos outros eu fosse considerada ridícula (até porque nós dois, quando juntos, não passávamos de dois ridículos - imagino Fernando Pessoa rindo de nós). Me ensinou justamente a buscar meu espaço de ser ouvida, quando nem eu mesma confiava na força da minha palavra... Seria por isso que você pode ter se sentido traído? 


E você já parou pra pensar alguma vez em como EU me senti traída tendo sido levada por você a acreditar numa história de amor que SÓ VOCÊ já sabia que não teria futuro? Quantas dúvidas e noites solitárias pensando em como me afastar pra não ser apenas mais um instrumento em suas mãos? Os planos que eu arquitetava caminhando até a Urca decidida a fugir dos seus gracejos, abraços (às vezes até carregando no colo), das flores e frutinhas que você arrancava dos arbustos do caminho e me oferecia; das centenas de mensagens a qualquer hora do dia ou da noite... Das 15, 20 ligações por dia, algumas de 2 horas de duração às vezes só falando bobagens (lembro até do dia que você me deu bronca porque a SUA mulher tinha visto no seu celular essas ligações que VOCÊ me fazia - eu sempre odiei ligar, até hoje sou da escrita)... E do coração que você desenhou e pintou no meu caderninho (sem deixar eu ver) dias depois de ter agradecido pela carta-declaração que te escrevi de aniversário mas dizer que "achava bonito, mas não sentia nada daquilo". Olha... Você me deu muito trabalho! Até mesmo no dia que conversei seriamente com você e pedi pra gente se afastar pois todo aquele "namoro de quinta série" tava me fazendo mal, e você até concordou (depois de muitos argumentos), escondendo os olhos vermelhos, mas não durou muito... Logo estávamos grudados de novo e era muito difícil amar alguém que dizia não me amar (por motivos que até hoje não entendo) mas agia como se eu fosse o amor de sua vida...


Mesmo assim, a gente se fazia bem. A gente estimulava o melhor um no outro. Você se interessava em ouvir meus problemas; meus pensamentos, sentimentos e intelecto, e toda vez que você estava a se posicionar impulsivamente da forma que aprendeu por anos, eu tava lá pra segurar sua onda e mostrar que não era bem por aí. Você era a Força, eu a Estratégia. Só que a Vida realmente teve que nos afastar, né: primeiro a ti, a quem "acusei" de jubilado. Depois a mim, que realmente fui jubilada, ironicamente. Engraçado, né... Bem, eu prefiro olhar hoje isso tudo com bom humor. Afinal, é o que me resta, dentre tantas preocupações que tenho que pensar agora... Acho que por isso também não tenho pensado em nós: agora eu sei dos meus processos antes de (re)inserir qualquer pessoa na minha vida - além de todos os meus problemas, eu vou ter que estar aberta ao que você tiver a oferecer. Será que eu tô pronta?... Você também deve estar tendo os seus processos - quem sou eu pra atrapalhar?...


Por isso sigo confiando na Espiritualidade: eles não erram nunca - quem erra sou eu que volta e meia interpreto tudo errado.


Axé-Shalom-Amém!